segunda-feira, 14 setembro 2020 16:35

Pela superação da crise capital

Contributo de Ana Sofia Ligeiro, António Ramoa Lima, João Carvalho, Pedro Abreu, Pedro Miguel Cardoso, Sílvia Carreira e Victor Pinto.

Atravessamos uma crise histórica. A humanidade enfrenta desafios económicos, sociais e ecológicos que refletem a desadequação do modo de produção capitalista para gerar uma sociedade em harmonia consigo própria e com a natureza.

A dinâmica expansionista do sistema capitalista é alimentada continuamente pelo crescente consumo de energia e de matérias-primas. Neste processo a natureza é encarada como externa à economia e à humanidade.

Na promoção do crescimento económico, que o capitalismo quer contínuo e infinito, atropela-se o bem-estar humano e a natureza. Há muito que é clara a degradação ecológica do planeta. Em vez de mudar o curso destrutivo, o capitalismo tem encarado a emergência ambiental como mais uma oportunidade para lucrar e promover negócios, que designa como “verdes” ou “ecológicos”.

Economia disfuncional

A acumulação de capital gerada a partir da produção, mesmo quando o crescimento da economia abranda, baseia-se numa economia onde o aumento de vendas é prioritário, estimulada pela obsolescência programada, bens de luxo e armamento. Muita energia e recursos naturais são gastos para alimentar esta economia de desperdícios.

A dimensão económica da crise pode ser descrita em torno de três tendências que se reforçam mutuamente: monopolização, estagnação das economias capitalistas maduras e financeirização. Tendências que produzem e são alimentadas pelas desigualdades sociais, pelo desemprego e pela precariedade. Pautadas por frequentes crises financeiras e na predação de recursos naturais, que origina guerra, fome e migrações.

A queda da taxa de lucro registada pelo capital produtivo nas últimas décadas resultou numa crescente dependência das economias ditas desenvolvidas da finança especulativa para a acumulação de capital. Em paralelo, registou-se a estagnação e o declínio dos salários reais que conferiu ao capital financeiro um poder reforçado sobre o trabalho, consumindo cada vez mais os lucros do setor produtivo. As rendas das finanças englobam as rendas provenientes do falso incremento dos rendimentos dos trabalhadores pelo crédito.

O Produto Interno Bruto (PIB), indicador supremo na economia capitalista, mede os bens e serviços que tenham valor monetário, nunca o bem-estar das populações ou os impactos ambientais da actividade económica. Neste contexto, o PIB apresenta demasiadas limitações para ser encarado como indicador central do estado de um país. É uma ilusão acreditar que o crescimento do PIB é a solução para os problemas que enfrentamos.

Acreditamos na inutilidade do crescimento económico permanente, principalmente quando este implica a mercantilização de tudo, com a finalidade de acumulação de capital como lógica de poder. A economia de mercado torna-se numa sociedade e natureza de mercado, na perspetiva ilusória de que é possível crescer infinitamente num planeta com recursos finitos.

Destruição dos ecossistemas

Estamos numa época marcada pelas alterações climáticas e por uma clara destruição da biodiversidade e extinção em massa de espécies.

A um nível global, alguns dos ciclos mais fundamentais da natureza, como os da água e do azoto estão significativamente desestruturados nas suas dimensões geográficas e temporais.

A intensa industrialização e a utilização maciça de água que lhe está associada, diminui a disponibilidade de água potencialmente potável e aumenta a contaminação das massas de água, superficiais e subterrâneas.

Os cursos dos rios, com raras exceções, foram completamente “humanizados”, impedindo o transporte de sedimentos e de nutrientes para o oceano, afetando também a migração dos peixes. No mar, esta deficiência tem impactos significativos na proteção da orla costeira e na subsistência da fauna e flora marinhas.

Na agricultura o recurso generalizado a fertilizantes à base de azoto, com vista a multiplicar os ciclos de produção naturais, tem levado a uma explosão da presença deste elemento nos solos com a sua subsequente incorporação no ciclo da água e na atmosfera. Isto resulta na acidificação dos solos e das águas, redução da biodiversidade e destruição de ecossistemas terrestres e marinhos.

Sabe-se que as alterações climáticas estão a aumentar a vulnerabilidade das comunidades e dos ecossistemas e a gerar ondas migratórias maciças.

Transição e alternativa ecossocialista

Necessitamos de um projeto ecossocialista que articule o sistema económico com a natureza. Um socialismo que priorize a recuperação de ecossistemas e garanta a satisfação das necessidades de todos, sem esgotar recursos e sem destruir o suporte biofísico à vida humana e à solidariedade intergeracional.

Travar o desastre anunciado do capitalismo só acontecerá se concentrarmos esforços para que se concretize a transição social e política. A alternativa terá que ser sistémica, socialmente justa e ecologicamente sustentada.

O que ambicionamos é uma sociedade justa, que não se baseie na acumulação, mas na partilha de recursos e tempo, porque defendemos que a qualidade de vida implica uma distribuição mais socialmente justa do trabalho e mais tempo livre.

Este modelo alternativo tem que transformar as formas de propriedade, as relações de produção, mas também a força produtiva.

Ideias para a alternativa

Para que uma sociedade mais justa se junte à salvaguarda ambiental, é necessário planificar a economia no sentido da neutralidade carbónica e da proteção e recuperação da biodiversidade.

É necessária justiça social e internacional. À soberania democrática dos povos deverá juntar-se um protecionismo solidário, que garanta a qualidade, a proteção laboral e a sustentabilidade da produção de cada país.

A tecnologia deverá estar ao serviço da humanidade e da natureza, e deverá adequar as formas de produção ao que os territórios conseguem produzir com a manutenção do seu equilibro ecológico.

A economia deverá evoluir no sentido de prover as necessidades reais, abandonando a quimera do crescimento. Se a equidade, a solidariedade e a sustentabilidade implicarem um decréscimo económico, o decrescimento deverá ser gerido.

A melhoria da qualidade de vida deverá passar pelo pleno emprego, pela distribuição e partilha do trabalho. O tempo livre deverá ser valorizado. É urgente diminuir a jornada de trabalho.

Tem que se construir a soberania democrática nas áreas do sistema monetário e financeiro, da energia e da produção alimentar, discutindo de forma concreta que níveis de internacionalização destas matérias é aceitável.

Devem ser regulados os serviços de ecossistemas e colocar em prática o que há tanto tempo se procura: o valor da qualidade ambiental, o valor da natureza e da biodiversidade. É importante apoiar quem garante a manutenção dos valores naturais, que suportam a biodiversidade.

O setor primário deverá caminhar no sentido de extinguir os modelos de produção intensiva, quando poluidores e depauperadores de recursos. Ao invés, a agricultura familiar e a pequena pesca sustentável, em respeito pela biodiversidade, deverão ser apoiadas, assim como os modos de produção biológica e integrada.

Nota conclusiva

Mesmo com um sistema internacional adverso, cada país pode avançar e dar saltos revolucionários na necessária transição civilizacional e de modo de produção. É por isso fundamental que a convergência entre partidos e movimentos sociais seja feita em torno de um programa ecossocialista, que construa uma relação equilibrada entre uma sociedade justa e a natureza.


*Por Ana Sofia Ligeiro, António Ramoa Lima, João Carvalho, Pedro Abreu, Pedro Miguel Cardoso, Sílvia Carreira e Victor Pinto

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