O Bloco de Esquerda manteve o número de deputados eleitos, continuou a ser a terceira força política, melhorou sensivelmente a distribuição geográfica da sua votação e envolveu na campanha muitas dezenas de aderentes e simpatizantes de diferentes gerações, o que só pode ser saudado e apreciado positivamente.
Mas não conseguiu reforçar-se em número de votos nem é nada claro que tenha sido pela sua acção que se impediu a maioria absoluta do PS. E foi em torno destes aspectos que radicou toda a estratégia eleitoral. Podemos, à luz do que foi essa estratégia, dizer que obtivemos uma vitória nas eleições de 6 de Outubro?
A organização bloquista, de baixo acima, tem o dever de debater esta questão. As correntes maioritárias do Bloco, onde se incluem formal ou informalmente os principais dirigentes, devem explicar porque razão perdeu o Bloco quase 51 mil votos e para onde foram esses votos, isto é o mínimo que se exige a uma direção que respeita as suas bases.
É preciso explicar porque se optou por uma deriva triunfalista que insistiu na possibilidade de eleição de novos deputados em círculos como Viseu, Faro ou Viana do Castelo, iludindo os aderentes e dando sinal de eleitoralismo inconsistente.
É preciso explicar por que se perderam em distritos como Lisboa, Porto e Setúbal, onde a concentração de votos é tradicionalmente maior, mais de 38 mil votos, isto é, 75,3% do total de votos perdidos.
É preciso explicar o verdadeiro desastre eleitoral na Madeira, onde se perderam os dois deputados regionais e o deputado à Assembleia da República e onde, nesta eleição, se perdeu praticamente metade da votação.
Insistimos que é preciso retirar desta situação as necessárias e devidas consequências em termos colectivos e em termos individuais.
É preciso deixar de iludir a realidade com um manto diáfano de fantasia. Pela nossa parte, dizemos:
A estratégia eleitoral do Bloco revelou-se incapaz de capitalizar os magros êxitos do apoio parlamentar ao PS e, rebaixando objectivamente bandeiras de luta que o PS não quis resolver e em que se bandeou à direita, como nas áreas da saúde, educação, trabalho ou ambiente, reduziu o Bloco à condição de parceiro bem comportado, com um discurso anacrónico sobre a estabilidade, as contas certas e até sobre o carácter social-democrata do nosso programa. Além disso, desarmou o eleitorado sobre o que é e o que representa efectivamente o PS enquanto partido e acentuou a tendência parlamentarista e tacticista que se vinha agravando desde a última Convenção.
Objectivamente, a direcção do Bloco preferiu a disputa da governabilidade ou a reedição do acordo parlamentar com o PS à afirmação programática e à procura de uma maioria social, que desapareceu do nosso discurso político, rebaixando o papel das lutas laborais e populares de massas, que são, efectivamente, o motor das rupturas e das transformações sociais numa perspectiva socialista.
A evidente falência da estratégia do Bloco, que descurou inclusivamente o combate político e ideológico às manifestações de direita e extrema direita, à verborreia oleosa do PAN, acabou objectivamente por reforçar a capacidade polarizadora do PS, criando um quadro que potencia a sua aliança com a direita quando assim o entender, dispensando acordos e entendimentos à esquerda. Deste cenário beneficiou também o Livre que conseguiu a eleição de um deputado.
Foi aqui que nos conduziu esta direcção do Bloco, que moldou e blindou uma organização centralizada, onde não há discussão política, onde as listas de candidatos são um mero arranjo entre as tendências maioritárias, onde o próprio programa eleitoral, tardiamente apresentado, não foi discutido, onde se calam, desrespeitam e estigmatizam as opiniões dos aderentes e das estruturas intermédias e de base.
O Bloco de Esquerda é do colectivo de aderentes que o constroem e animam todos os dias com o seu esforço e as suas inteligências e não de um pequeno núcleo de dirigentes, que por mais capazes e por mais simpáticos que se queiram apresentar publicamente, se arrogam a ditar e a fazer o que entendem sem ouvir os aderentes. Que desvalorizam o trabalho local e autárquico e repartem milimetricamente e de modo asfixiante, os lugares na direcção e no aparelho, entre as duas tendências que representam, querendo iludir o facto de que a esmagadora maioria dos aderentes não pertence a qualquer dessas tendências.
Defendemos o regresso à matriz originária do Bloco, uma organização, com perfil de partido-movimento de esquerda, amplamente democrático, popular e socialista que trabalha por rupturas e transformações sociais em benefício dos trabalhadores, das classes populares, contra todo o tipo de discriminações e de exclusão social. Queremos Mais Bloco.
O Grupo Mais Bloco/ Democracia Socialista é um colectivo informal herdeiro das antigas moções B, das suas propostas políticas e de defesa da democracia interna. Aderentes de primeira hora, muitos, chegados outros em diferentes momentos destes 20 anos de existência que levamos, queremos um Bloco mais democrático, mais à esquerda, mais consequentemente socialista. E é no seio do Bloco que iremos continuar a intervir.