terça-feira, 17 julho 2007 14:47

Forte da Casa (V. F. de Xira): A deriva autoritária

Forte da Casa (Junta de Freguesia)No passado dia 1 de Junho decorreu em Cotovios a última Assembleia Municipal de Vila Franca de Xira. No período de antes da ordem do dia, a bancada do Bloco de Esquerda apresentou uma moção em que propunha a condenação do Presidente da Junta de Freguesia do Forte da Casa e a instauração de um inquérito para apuramento de factos, na sequência da proibição da realização nas instalações daquela Junta de um colóquio sobre ambiente promovido pela associação Os Amigos do Forte.
Opinião de João Machado

Na sequência de um requerimento apresentado pela bancada do Partido Socialista, que tem maioria absoluta naquela Assembleia Municipal, foi inviabilizada a discussão e votação daquela moção. No dia 15 de Junho, na Assembleia de Freguesia do Forte da Casa, a CDU e o PSD apresentaram igualmente moções reprovando a atitude do executivo da Junta de Freguesia, que a bancada do PS, que também detém a maioria absoluta naquele órgão, rejeitou.

A imprensa local já fez várias referências a este episódio. Os factos são claros: estava marcada para o passado dia 25 de Maio uma sessão promovida pela associação Os Amigos do Forte sobre questões ambientais, para decorrer nas instalações da Junta de Freguesia do Forte da Casa, que já tinha anuído em ceder a sala. Inclusive, a própria autarquia tinha afixado publicidade da sessão. Entretanto no próprio dia da sessão, a Junta de Freguesia informou os Amigos do Forte que não autorizava a realização da sessão nas suas instalações. A razão indicada para esta abrupta proibição foi que Idalino Mateus e Eduardo Vicente, respectivamente Presidente e Vice-Presidente de Os Amigos do Forte, tinham apresentado uma acção em Tribunal contra a Junta de Freguesia e a Câmara Municipal de Vila Franca de Xira.

É verdade que aqueles dois cidadãos apresentaram em tribunal uma Acção Popular visando aqueles dois órgãos autárquicos. Contudo, não o fizeram na qualidade de dirigentes da associação visada pela proibição da Junta de Freguesia do Forte da Casa, mas como primeiros signatários de um abaixo-assinado relativo ao problema do trânsito da Rua dos Combatentes, que resolveram apresentar a referida queixa no Tribunal Administrativo e Fiscal de Loures.

O abaixo-assinado, com 122 assinaturas, foi entregue na Junta de Freguesia do Forte da Casa em 2002. Os signatários exigiam à autarquia que providenciasse no sentido de resolver os complexos problemas de trânsito existentes na Rua dos Combatentes. A Junta de Freguesia, em 2006, desenvolveu obras para tentar resolver esses problemas, mas deu prioridade ao espaço para estacionamento de carros, em detrimento da largura dos passeios, que ficou aquém do mínimo imposto por lei. Deixou ainda por resolver vários problemas relacionados com a canalização do gás, caixas de electricidade, postes de iluminação e outros. Daí a razão da acção interposta no TAF de Loures. Frise-se que a associação cívica "Os Amigos do Forte" foi criada em 2004.

Estamos assim perante uma retaliação da Junta de Freguesia do Forte da Casa sobre uma associação de defesa do património e dos interesses dos habitantes, invocando razões que transcendem a mesma. Publicamente, o Presidente da Junta de Freguesia, António José Inácio invoca questões de lealdade para justificar a decisão do executivo a que preside. Pergunta-se: quem foi desleal? Idalino Mateus e Eduardo Vicente, por terem recorrido ao Tribunal para tentarem obter uma resposta melhor para os problemas de trânsito automóvel e pedonal da Rua dos Combatentes, contra os quais há vários anos se movimentam? Obviamente que não. Recorrer a um Tribunal é um direito dos cidadãos. O Tribunal poderá ou não dar-lhes razão, já é outro problema. Agora o recurso à justiça por cidadãos contra o Estado ou uma autarquia poderá ser considerado um incómodo, mas nunca uma deslealdade. Veja-se o caso de Sá Fernandes e o Túnel do Marquês. O Vereador da Câmara Municipal de Lisboa do Bloco de Esquerda não conseguiu evitar o erro estratégico, em termos de mobilidade, que constituiu a realização desta obra, mas pelo menos conseguiu que fossem introduzidos muitos melhoramentos no projecto inicial, que sempre atenuam os perigos e inconvenientes resultantes para quem vive e circula na capital. Teve de recorrer aos tribunais, para conseguir contrariar a pressa dos promotores da obra.

Invocou ainda António José Inácio, no debate que ocorreu na Assembleia de Freguesia  de 15 de Junho, como justificação da proibição feita, ter convocado Idalino Mateus e Eduardo Vicente para a Junta de Freguesia, mas que estes se recusaram a comparecer. Pergunta-se: qual a norma que os obrigaria a comparecer? E o que pretenderia o Presidente da Junta de Freguesia do Forte da Casa.

A atitude do executivo da Junta de Freguesia do Forte da Casa é mais grave ainda por ter sido tomada colectivamente e por unanimidade, não sendo uma posição apenas do seu Presidente. E as posições tomadas pelas bancadas do Partido Socialista, na Assembleia Municipal e na Assembleia de Freguesia, ao impedirem a discussão da moção apresentada, no primeiro caso, ou ao reprovarem as moções apresentadas, no segundo caso, com alegações de se tratar de uma caso menor e de haver aproveitamento político por parte de quem reage, implicam haver uma cobertura partidária a este tipo de situações.

É preciso, antes de mais, compreender que não se trata de um caso menor, mas de mais um sinal de a democracia em Portugal está a deteriorar-se. Um órgão de soberania ou do poder local tem de aceitar que os cidadãos têm o direito de contestar as suas decisões ou a sua actuação, utilizando todos os meios legítimos. E que a essência da democracia assenta no exercício desse direito. Obviamente que quem recorre aos tribunais contra um órgão de soberania ou de poder local está em litígio com ele, mas de um modo legítimo. É abusivo da parte de quem detém o poder retaliar procurando atingir os interesses particulares do queixoso. E no caso vertente, a retaliação incidiu não sobre as pessoas dos oponentes da Junta da Freguesia do Forte da Casa, mas sim sobre uma associação onde os dois exercem funções. Com a sua decisão, o executivo da Junta de Freguesia causou prejuízos aos Amigos do Forte, para tirar desforra de uma atitude legítima de dois cidadãos. Mesmo que a queixa tivesse sido apresentada em nome da associação, a atitude da autarquia constituiria sempre um abuso de poder.

A democracia assenta na livre expressão e na participação dos cidadãos e das populações na vida cívica e política. Castigar ou ameaçar os cidadãos sempre que a sua actuação não agrada aos detentores do poder, é coarctar essa participação. Temos assistido a vários exemplos ultimamente, no nosso país, de situações que infelizmente reflectem essa atitude. Recorde-se a situação subjacente ao processo movido pela Direcção Regional de Educação do Norte contra o Professor Charrua (veja-se o que, a este respeito, escreve Ana Gomes no blogue Causa Nossa), ou o caso do convite à Associação de Professores de Matemática para abandonar a comissão de acompanhamento do plano de matemática, após criticar declarações da Ministra da Educação. São casos mediáticos, com os quais a atitude da Junta de Freguesia do Forte da Casa no passado dia 25 de Maio tem bastantes analogias. Entretanto lê-se na imprensa que na inauguração das instalações do grupo de teatro "Gruta Forte", o Presidente da Junta de Freguesia do Forte da Casa apelou para "uma grande lealdade no trabalho". É legítimo porem-se interrogações sobre o sentido que António José Inácio dá à palavra lealdade.

Mas o mais grave é constatar o que o Partido Socialista, do alto da sua maioria absoluta, faz com o poder. Em vez de fazer com que o país beneficie da riqueza que traz a diversidade de ideias, procura enxotar quem o incomoda, não hesitando em recorrer aos poderes de que dispõe e que lhe foram confiados pelo povo. Começa a tornar-se urgente pensar em alternativas a este estado de coisas.

Carlos Patrão

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