Intervenção do Bloco na Assembleia Municipal
Nesta Assembleia, mas em 21 de Dezembro do ano passado, aquando da análise do Orçamento e das Grandes Opções do Plano, dissemos que o Orçamento tinha implícita a opção política de "avançar para a entrega dos serviços de águas e saneamento à empresa Águas do Centro" --- uma das razões aliás, por que votámos contra esses documentos.
Não nos enganámos , aqui está a proposta, seis meses depois.
Julgo que devemos ter em conta, antes de mais, o que significa aderir à empresa Águas do Centro, ficando as Câmaras com a minoria do capital e as Águas de Portugal com a maioria.
Estando o sector das águas aberto à iniciativa privada desde 1993 e estando, desde então, a ser alvo dos apetites privatizadores dos grandes grupos económicos (sobretudo franceses, como a Géneral des Eaux), o passo que aqui nos é proposto é o desenrolar de uma passadeira para a privatização da distribuição da água (por enquanto só em alta) e do saneamento.
Ora nós, Bloco de Esquerda, somos contra a entrega deste sector ao capital privado. Não por fundamentalismo "antiprivado" - essa acusação que às vezes nos dirigem não passa de mais um boato... ---, mas porque a água é um bem essencial à vida de todos, é determinante para o equilíbrio e sustentabilidade do ambiente. A água é um bem finito e precioso que não pode ficar à mercê da lógica dos negócios nem da maximização dos lucros.
Porque é evidente que a gestão privada da água terá sempre como primeiro objectivo a maximização do lucro e a remuneração dos accionistas, em vez da poupança, da universalidade do acesso e da qualidade ambiental. Recordo, com o já fez o vereador Henrique Leal, algumas experiências anteriores neste domínio.
A experiência de Setúbal, por exemplo, num contencioso com as Águas do Sado devido a aumentos de preços superiores à inflação. Ou de Viana do Castelo, onde a empresa concessionária se recusou a levar a água a zonas de maior declive, por questões de rentabilidade. Ou os exemplos de Castelo Branco, ou de Barcelos...
Aliás, reconheça-se, nem a análise presente à Câmara recomenda a adesão às Águas do Centro por outros motivos que não estritamente financeiros. Ou seja, implicitamente, reconhece-se que a adesão à empresa Águas do Centro não traz qualquer mais valia noutro domínio que não esse. E mesmo nesse...
Os lucros das Águas do Centro, esses sim, sabemos que irão estar sempre garantidos, pois essa empresa acautelou-os e escreveram-no "preto no branco" na proposta de adesão que aqui nos é presente. Quem vai pagar os investimentos? Os munícipes, claro. Que pagarão também os lucros, como é óbvio.
Daí as enormes subidas de preços que se antevêm caso esta proposta passe na Assembleia Municipal.
Por estas razões votaremos contra.
Mas vamos, por instantes e por rigor de análise, admitir que tínhamos de encontrar um parceiro externo ao município, para distribuir a água em alta. Quem nos diz que esta é a melhor fórmula? Onde é que isso está demonstrado?
Em lado nenhum. Esta proposta e a consequente decisão favorável na Câmara Municipal antes parece decorrer de um preconceito apriorístico. É assim porque é bom, ponto final.
Mas...ainda que fosse. Quem nos diz que, mesmo com a fórmula adoptada, as Águas do Centro são o melhor parceiro? Ninguém, porque não foram consultadas outras empresas. O PSD, em palavras sempre cioso dos valores "do mercado e da concorrência", neste caso mandou o mercado "ás urtigas" (se me é permitida a expressão). É Águas do Centro e mais nada, decidiu.
Mas...ainda que fosse. Quem nos diz que é boa a proposta apresentada? Não certamente a análise da proposta que foi entregue aos vereadores e que fundamentou a decisão camarária, análise que nos merece reservas.
De facto, diz-se aí não haver mais comparticipações comunitárias neste domínio. Que entidade responsável já escreveu isso peremptoriamente? Onde é que está escrito que é assim, definitivamente?
Mais ainda. Quem validou o montante de 5 milhões de euros para uma nova ETAR. O Senhor Presidente da Câmara, em campanha falava em 3,5 milhões. Mais milhão, menos milhão, afinal em que ficamos?
E já agora, de onde saiu o valor do spread de 0,500% apresentado na simulação dos encargos da Câmara se investisse ela própria na ETAR, um valor que parece encomendado para demonstrar que a Câmara ficaria com encargos incomportáveis?
É que, senhoras e senhores deputados, temos para votar no ponto 5 desta Assembleia, a contracção de um empréstimo com um spread 5 vezes mais baixo! Afinal a simulação parece ter sido simulada, para tirar uma conclusão... que já estava tirada.
Resumindo e concluindo: por razões de princípio, porque é mau para os munícipes, porque é má opção e porque é um mau negócio, o Bloco de Esquerda vota contra a adesão do Entroncamento à empresa Águas do Centro.
30 de Junho de 2006
A Bancada do Bloco de Esquerda na Assembleia Municipal do Entroncamento