Plataforma Unitária – Resolução do Plenário Nacional de 13.02.16
1 – Os anteriores plenários nacionais da Plataforma Unitária, em Maio de 2015, discutiram as eleições legislativas. Passaram quase 9 meses. Durante este período, travámos duas importantíssimas batalhas que mobilizaram todas as nossas energias: eleições para a Assembleia e para a Presidência da República, nas quais o Bloco alcançou os melhores resultados de sempre.
2 – Desde aqueles plenários, não mudou tudo na política portuguesa mas mudou muita coisa. A nossa reflexão incide sobre essas mudanças – o que mudou, os fatores que as determinaram, os impactos na vida do país e dos portugueses, o sentido que elas revelam, o que fazer perante elas e como as aprofundar. Uma reflexão que tem em conta a análise realizada pela direção do Bloco mas que, a partir dela, vai mais longe na identificação e na resposta aos novos problemas políticos com que estamos confrontados. Uma reflexão com sentido prático, a pensar nos próximos meses, nas linhas da nossa intervenção e nas medidas para o reforço do Bloco. Mas que também faz uma primeira abordagem à próxima Convenção do Bloco (desafios, respostas, preparação, relação com outras sensibilidades).
3 – Em menos de seis meses, formou-se uma nova maioria no parlamento, mudou o governo e o novo PR é Marcelo, eleito à primeira com o apoio da direita e a “desistência do PS”. António Costa governa apoiado em acordos estabelecidos com os três partidos da esquerda parlamentar, cujo principal eixo é a recuperação dos rendimentos, do emprego e do Estado social, numa dupla lógica: parar o empobrecimento e reverter as medidas mais prejudiciais do anterior governo. Nunca tal havia acontecido na democracia portuguesa; pela primeira vez, o PS assume um acordo político à esquerda sobre a governação. Foi o maior peso eleitoral e político da esquerda, em particular do Bloco, que determinou essa inflexão e impôs uma mudança de orientação política para o país. A esquerda fez bem em jogar esse peso reforçado na celebração de um acordo que, mesmo sendo de mínimos, muda a política do país.
4 – Na sequência dos resultados eleitorais, o Bloco deixou de ser o partido a que muitos vaticinavam o definhamento e passou a terceira força política no país. O Bloco reconquistou a confiança de meio milhão de portugueses, é hoje a grande esperança para uma mudança que defenda as pessoas. A nossa influência e projeção aumentaram significativamente mas, o que cresceu sobretudo - e muito - foi a nossa responsabilidade política perante as pessoas. O desafio é hoje muito maior: o que se espera de nós é combate à austeridade, à alta finança e à Europa de Merkel, mas também soluções para os problemas. A capacidade de satisfazer esta expectativa é decisiva para aumentar e consolidar o enraizamento do Bloco. A alavanca da credibilidade ou do descrédito do Bloco está aí.
5 –O acordo que assinámos com o PS, apesar de limitado no seu alcance, traduziu-se numa série de ganhos para as famílias mais desprotegidas e para os trabalhadores, bem como na aprovação, pelo governo e pelo parlamento, de novas políticas que anulam escolhas negativas do anterior governo em diversos domínios da vida do país, com claros benefícios para muitos portugueses.
É certo que algumas dessas mudanças são demasiado tímidas e ficam aquém do necessário. Mas, no seu conjunto, respondem a aspirações do povo, concretizam compromissos eleitorais do Bloco, sinalizam a mudança desejada e sublinham o acerto e a importância do acordo que estabelecemos com o PS, na base do qual António Costa conseguiu formar governo. A continuidade da direita no governo teria significado uma nova etapa – mais radical e violenta – de austeridade, privatizações e desqualificação dos serviços públicos.
Perante a ofensiva mediática da direita – a oposição, hoje, está mais na comunicação social e no concerto de comentadores do que nos partidos de direita – é indispensável divulgar e valorizar muito mais as medidas aprovadas nestes primeiros meses.
6 – A transposição para a proposta de OE2016 dos acordos com o PS traduziu-se, em pontos importantes, num recuo do governo e do PS, que cedeu às pressões da Comissão Europeia. Tal como já acontecera com o Banif e com o orçamento rectificativo – em que o governo fez o que a CE mandou - estes episódios ilustram duas realidades incontornáveis e que não podemos ignorar na definição da linha política: a força da UE e a fraqueza do PS. Num quadro político de grande incerteza e imprevisibilidade, é certo que uma e outra constituem o principal travão à concretização dos acordos com o PS, potenciam conflitos com os partidos à esquerda, enfraquecem o governo e bloqueiam a possibilidade de maiores avanços.
7 – As pressões europeias não podem servir ao PS para justificar as posições que defende no plano interno nem para se desculpar do esvaziamento ou adiamento das medidas acordadas. O Bloco deve fazer da reafirmação da sua oposição à pressão europeia e da insistência no primado da Constituição sobre os tratados europeus e da soberania democrática sobre os credores e a elite europeia pilares claros do seu posicionamento político no relacionamento com o PS e com a sociedade portuguesa.
Não é difícil antecipar que as exigências e imposições da União Europeia vão agravar-se no contexto da preparação e discussão do próximo PEC e do OE para 2017, elevando a tensão política e a pressão sobre o governo. O conflito com a UE é o campo da disputa política que temos pela frente. Não travamos essa disputa para fragilizar o governo nem como pretexto para romper o acordo com o PS mas não aceitamos que a UE seja usada pelo PS como álibi dos seus recuos e cedências. É no confronto com a política europeia que o Bloco afirma a sua identidade, marca a diferença, conquista influência e acumula forças para outros combates. Este é um terreno privilegiado para retomar o diálogo e a iniciativa comum com gente independente ou ligada a outros setores de esquerda. A dinâmica de luta, resistência e desobediência à Europa, traduzida numa linha de iniciativa unitária e agregadora para este segundo round do combate à troika, é um eixo essencial para a ação política do Bloco.
8 – O acordo estabelecido com o PS continua a ser um espaço de disputa política. Há medidas concretizadas mas há outras que ainda não saíram do papel e outras estão cumpridas apenas parcialmente. Por outro lado, os recuos em sede de OE – TSU, impostos sobre consumo – devem ser “compensados” por outras medidas que respondam às expectativas populares e cuja reclamação o Bloco deve protagonizar seja no debate do próprio OE seja para além dele. Não se trata de avançar com um novo acordo, trata-se de acelerar o cumprimento do atual – 35h, tarifa social – e de avançar com uma “segunda vaga” de ideias e propostas. O Bloco deve concentrar-se na elaboração dessas propostas, valorizá-las e divulgá-las publicamente, vincar o seu papel e a importância do seu contributo na aprovação dessas propostas alternativas. A Plataforma Unitária empenha-se na dinamização dos grupos, reuniões e redes de articulação decididas na MN, como contributo para mobilizar as pessoas, dar resposta aos seus problemas concretos e promover publicamente as propostas do Bloco. Dar a conhecer ao país as nossas propostas e o nosso papel é um outro eixo fundamental da nossa intervenção.
9 – O Novo Banco e a dívida são, a curto prazo, pontos de divergência e potencial conflito com o PS e o governo, para os quais nos devemos preparar. A dívida é um brutal constrangimento à política económica, ao investimento público, às políticas de emprego e ao financiamento do estado social. Sem outra política para a dívida, muito dificilmente o OE de 2017 continuará o sentido de mudança que, mesmo mitigada, encontramos no OE deste ano. A reestruturação da dívida continua no centro da nossa alternativa.
A solução para o Novo Banco – cuja venda o actual governo mantém - e, de uma forma mais geral, a política para a banca e sector financeiro, traduzem mais uma vez as pressões e ingerências da UE que o Bloco não pode aceitar.
Sem prejuízo da afirmação das nossas posições, o Bloco deve mobilizar respostas unitárias, amplas e representativas quer sobre a dívida quer sobre o Novo Banco.
Neste contexto, a intervenção do Bloco no inquérito parlamentar ao Banif deve ser encarada como um instrumento fundamental de mobilização da opinião pública contra a política de pôr os contribuintes a pagar os resgates e a salvação dos bancos e em defesa do controlo público da banca.
10 – O Bloco está empenhado na solução política encontrada para impedir a direita de continuar a governar. O acordo político com o PS permite travar a escalada da austeridade e do empobrecimento, responder a muitos problemas que degradam a vida dos trabalhadores e das famílias. Estamos conscientes das suas insuficiências, limitações e fragilidades. As pressões europeias, as cedências do Governo e as tendências centristas dentro do PS contribuem para a precarização destes difíceis equilíbrios. Face à dimensão dos problemas sociais e económicos do país, esta solução para vingar exige, à esquerda do PS, uma esquerda forte e consequente que o Bloco deve polarizar.
Pela nossa parte, não estamos neste processo para acumular capital de queixa nem para encontrar pretextos de saída. O Bloco deve enfrentar as hesitações e recuos do PS com mais combate político mas também disposto ao diálogo e à procura de novas soluções para os problemas. Para esse combate político, para esse diálogo, o Bloco deverá procurar uma melhor articulação com o PCP.
Neste delicado contexto, a intervenção do Bloco aposta e procura o sucesso do processo em que estamos envolvidos, avaliando e medindo esse sucesso pela capacidade de responder aos problemas concretos das pessoas e de satisfazer e cumprir os compromissos eleitorais e os acordos estabelecidos. Não basta denunciar e reverter as políticas do governo de Passos e Portas. É preciso construir, resolver, ter soluções para os problemas.
11 – Apesar das alterações verificadas na relação de forças à esquerda, o Bloco não dispõe da força política suficiente, por si só, para garantir o êxito deste processo nem a realização integral das expectativas entretanto criadas em largos setores sociais. A força das nossas propostas e causas está na capacidade de gerarmos movimento social em torno de cada uma, construindo e lançando dinâmicas de luta que vão muito para além das paredes do Bloco e que não se fechem nem esgotem no trabalho parlamentar.
A mobilização popular e o movimento social são decisivos para a forma como este processo vai evoluir, superar os seus pontos fracos e responder às expectativas geradas. Por outro lado, num cenário de ruptura, quem mais isolado estiver no plano social e político mais responsabilizado será pelo fracasso deste processo.
Portugal viveu um ciclo de mobilizações de dimensões inéditas, entre 2011 e 2014, que revelou a existência de um potencial de contestação e cidadania para além dos canais tradicionais. Esse ciclo não produziu efeitos imediatos, mas a atual solução política e os seus compromissos são também a expressão desse processo.
Além das mobilizações de rua, iniciativas como as que foram lançadas pelos movimentos de precários para uma nova lei de combate à precariedade, os protestos pelos transportes públicos em Lisboa e no Porto, o movimento em torno da TAP, os movimentos contra o aumento das rendas e os despejos, a multiplicação de espaços de expressão LGBT ou o recente movimento de opinião sobre a morte assistida mostram a importância da iniciativa cidadã e a sua força para marcar a agenda pública. O ativismo do Bloco e dos seus aderentes encontra nos movimentos sociais o seu espaço natural e privilegiado de intervenção. A intervenção da Plataforma Unitária é essencial para assegurar um Bloco virado para fora, para a sociedade, para os cidadãos, para os movimentos sociais.
O Bloco deve realizar, a curto prazo, um debate alargado sobre a nossa intervenção no movimento sindical e dos trabalhadores; sobre a reativação da intervenção nas escolas e no movimento estudantil, designadamente no secundário; sobre a agenda de combate ao sexismo e às discriminações LGBT; sobre a intervenção contra a precariedade neste novo ciclo político Ao mesmo tempo, o Bloco deve identificar causas em torno das quais é possível suscitar movimentos socialmente amplos e politicamente diversos, como acontece agora com a morte assistida, e que podem ser animados em torno das questões europeias, da dívida, da criação de emprego e da redução do horário do trabalho ou de novos direitos civis e políticos.
12 – No horizonte, não parece fácil uma alteração dos fatores que têm dificultado os processos de luta e a realização de grandes manifestações. O comedimento da CGTP e a forma como foi decidida e realizada a greve da função pública são disso testemunho. Estas dificuldades não serão vencidas de um dia para o outro. Sem prejuízo de responder na rua sempre que necessário e possível, as comemorações do 25 de Abril e do 1º Maio vão ser as grandes movimentações populares dos próximos meses, cujo conteúdo político deve reflectir mas também intervir sobre o momento que atravessamos.
13 – Sobre a Convenção, a Plataforma Unitária está empenhada num processo aberto e participado de preparação de uma moção conjunta à próxima Convenção. Essa moção deve renovar a orientação política do Bloco em face dos acontecimentos dos últimos meses, tendo em vista a construção de um Bloco coeso com uma direção solidária para as escolhas difíceis que teremos pela frente. O caráter aberto e participado deste processo é determinante para superar as fraturas saídas da última Convenção, construindo uma nova síntese política que integre o máximo da pluralidade do Bloco e incluindo as centenas de aderentes que chegaram ao Bloco durante os últimos meses. A Plataforma Unitária reunir-se-á com a Tendência Esquerda Alternativa e também com as moções B e R. Só assim se pode garantir que todos os que quiserem envolver-se neste processo aberto e participado o poderão determinar desde a sua primeira hora.
14 – Sobre o funcionamento da Plataforma Unitária, sendo necessário promover uma melhor articulação da nossa intervenção, a prioridade só pode ser juntar forças para uma maior dinamização do Bloco.
Há uma onda de adesões ao Bloco e muitos antigos aderentes mostram agora vontade de retomar o seu ativismo. Este é o momento de redobrar os esforços da Plataforma Unitária para mobilizar uns e outros e conquistá-los para a participação nas atividades do Bloco. É essencial este empenhamento da Plataforma Unitária no alargamento e renovação do universo da militância bloquista.
O próximo plenário nacional será em Abril para discutir as linhas principais para a Convenção, incluindo a orientação para as autárquicas de 2017.