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odilionobrega060812Odílio Nóbrega obrigou a empresa a ceder após fazer 100 horas de greve da fome. A sua luta foi contra um processo disciplinar que a empresa lhe instaurou. Na sua carta de agradecimento refere: "desconhecia quantas atrocidades são cometidas, diariamente, contra o povo e os trabalhadores desta região, isto, por aqueles que eu, brandamente, já tinha cognominado de instalados."
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CARTA DE AGRADECIMENTO

Caríssimos camaradas e amigos

Venho com esta carta manifestar a minha profunda gratidão para com todos quantos manifestaram a sua solidariedade para comigo. 

Como é do vosso conhecimento, encetei uma jornada de manifestação pública, de indignação perante a enorme prepotência adoptada pela OTRS - Operadora da Estação de Tratamento de Resíduos Sólidos da Meia Serra - consumada com perseguição e tentativa de opressão. Tendo esgotado todas as formas que, no meu entender, podiam ter sanado e solucionado todo este conflito, decidi, através de uma greve de fome e de profilaxia medicamentosa que durou cerca de 100 horas, manifestar-me contra a nítida inoperância do "sistema".

Jamais imaginei que, apesar de tão indigno, fosse bafejado por tão avultada manifestação de solidariedade. À medida que as horas passavam eram cada vez mais aqueles que se identificavam e reviam na minha luta. Efectivamente, desconhecia quantas atrocidades são cometidas, diariamente, contra o povo e os trabalhadores desta região, isto, por aqueles que eu, brandamente, já tinha cognominado de instalados.

O que de início era um caso circunscrito depressa se revelou uma verdadeira causa, digna de defesa popular. O meu caso tornou-se tão insignificante perante os relatos que me foram feitos, mormente, na primeira pessoa, e registados na minha alma. Assim, o que se me deparava como um cataclismo na minha vida transformou-se na mais valiosa lição de vida, passando a ser fonte viva do meu sustento.

Se por um lado sentia que o corpo desfalecia, por outro o espírito reclamava a constante interacção com o povo. Em todos os momentos a rua afeiçoou-se -me como o mais doce lar, onde somente se consegue encontrar o autêntico acolhimento fraternal, nunca, em tempo algum, senti-me tão próximo dos meus.

Todas estas inequívocas manifestações de solidariedade e os ternos olhares de desespero dos meus conterrâneos levaram-me a assumir publicamente, a 10/08/2006, perante DEUS e os Homens, que dedicaria o resto dos meus dias a defender e a lutar em prol dos perseguidos e oprimidos. Admito que ainda não delineei os métodos e as técnicas que utilizarei na implementação do meu intento, porém, para os mais cépticos e para os que deduziram tratar-se de uma alucinação originada pela fome, carece reiterar o assumido. Não descansarei enquanto não for restituída a SOBERANIA e LIBERDADE ao POVO.

O supra assumido revestiu-se de maior formalidade verificando-se o covarde silêncio a que a Valor Ambiente S.A., Governantes da RAM e alguns partidos políticos se remeteram. Afinal quem é que defende os lobbies? Parece-me que são muitos os que comem à mesma mesa, não obstante a camisola que vestem.

Verificando-se o agravamento do meu estado de saúde com imediata necessidade de assistência médica, que perdurou 24 horas, e envio do ofício da Inspecção Regional do Trabalho que dava conta da intenção da empresa em retomar as reuniões no próximo dia 28, decidi, por bem, suspender a greve de fome. Aliás, a aludida só se verificou em virtude da recusa da empresa em prosseguir a via do diálogo.

Apesar de ainda encontrar-me em convalescença e das recomendações dos médicos, incumbe-me a obrigação de proceder ao mais sincero agradecimento a todos vós que com a vossa inabalável solidariedade me destes forças para superar esta provação.

Nos meus sinceros agradecimentos gostaria de salientar o papel da minha família, dos meus amigos, das Confederações Sindicais, Federações Sindicais, Sindicatos, União dos Sindicatos, Delegações Sindicais que me apoiaram através dos seus Dirigentes, Delegados, Funcionários e Activistas os quais foram incansáveis. Não poderia esquecer todas as associações particulares, nacionais e regionais, à excepção da associação de deficientes da RAM que ainda não teve a coragem para se prenunciar. Em relação aos partidos políticos a minha gratidão dirige-se ao PCP - Madeira e ao Bloco de Esquerda - Madeira, pois, os restantes não tomaram posição, é normal que, a dois longos anos das próximas eleições, certos hipócritas esqueçam que é o povo que os elege e de forma muito particular os trabalhadores.

Todavia, o que mais me sensibilizou foi a demonstração de solidariedade preconizada por milhares de cidadãos anónimos, provenientes dos vários continentes e das mais variadas nacionalidades, com óbvio destaque para os meus conterrâneos.

É com eterna gratidão e profundo reconhecimento que agradeço a todos os supracitados esperando não ter esquecido ninguém.

Bem hajam em solidariedade   

Funchal, 14 de Agosto de 2006

Odílio Nóbrega