
O primeiro painel do Fórum intitulava-se precisamente "Precariedade e Disfunção Social" e contou com a presença de membros das CT's da transportadora aérea SATA e da empresa de distribuição de energia EDA, para além de sindicalistas do sector das pescas. A tentativa do governo do PS de entregar aquelas empresas aos privados foi bastante criticada pelos presentes, bem como a situação particularmente difícil dos pescadores, que trabalham sem salário fixo e em grande dependência do rendimento social de inserção.
No painel "Trabalho e Cidadania", com a presença de um jurista da União de Sindicatos de Ponta Delgada, um membro do colectivo "Precários Inflexíveis" e do assessor para a área laboral do grupo parlamentar do Bloco, foram apresentados e discutidos os efeitos das propostas do governo na diminuição dos direitos dos trabalhadores, bem como experiências de organização de trabalhadores precários que nos últimos anos se têm manifestado na iniciativa "Mayday", no 1º de Maio em Lisboa.
O encerramento deste Fórum realizado no Centro Cultural e Cívico de Santa Clara coube à dirigente bloqusta Zuraida Soares, que alertou para o drama da violência doméstica no arquipélago e sublinhou a importância de haver uma voz do Bloco na Assembleia Regional a partir das eleições de Outubro deste ano para reforçar a oposição aos projectos privatizadores de Caros César.
Intervenção de Zuraida Soares no encerramento do Fórum sobre Trabalho
Este ano, na nossa Região, em razão directa da violência em espaço doméstico, foram assassinadas duas mulheres e uma terceira tentativa de assassinato saíu gorada.
Esta vergonha, a violência em espaço doméstico, que atinge níveis desesperantes nos Açores, impõe um combate sem tréguas.
Temos perfeita consciência da herança que a Autonomia assumiu, relativamente ao atraso na Igualdade de Género e, por via disso, na forma retrógrada, como o papel da mulher, na sociedade, é encarado.
A constatação deste facto não releva mas, pelo contrário, impõe políticas firmes, no combate a este atraso civilizacional, que se repercute no acrescento de pobreza à nossa Região. A prática do Governo Regional, com a divulgação de alguns números do que tem sido feito nesta matéria, não é condizente com a monstruosidade deste problema, nem com as medidas sérias que ele exige.
Desde logo, com programas educacionais próprios, ao nível de todos os graus de ensino, orientados e praticados por pessoas assumidamente preparadas, as quais, pela sua compreensão de crianças e jovens, os leve à estigmatização deste tipo de comportamentos, anti-sociais.
Mas também, pela utilização dos Média, em particular, através de protocolos com a televisão e rádio públicas, para o combate a este flagelo, bem como pelo apoio atempado, sem listas de espera, às mulheres vítimas. Estas medidas poderiam ser exemplos de uma política social séria. Mas, como vem sendo prática, vai-se fazendo qualquer coisa, lenta mas muito publicitada, para efeitos mediáticos.
O assassinato destas duas mulheres e a tentativa de assassínio de uma outra (para já não falar do número incontável de mulheres que se confrontam, diariamente, com esta ameaça) não colheu, nem exigiu, nas consciências deste Governo Regional, a necessidade de uma tomada de consciência pública deste problema.
A insensibilidade social de que a governação do Partido Socialista vem, crescentemente, dando mostras, utilizando manobras propagandísticas para a esconder, não é fruto do acaso, mas calculo político bem determinado.
Na Região Autónoma dos Açores, a taxa de mulheres activas, isto é, no mercado de trabalho, é a mais baixa do país. Objectivamente, não contam para efeitos estatísticos, particularmente, para os dados estatísticos do desemprego.
Torna-se, pois, claro que uma política governativa assertiva sobre a dignificação do papel da mulher na sociedade, entra em contradição com a imperiosa necessidade de escamotear a realidade sobre a situação da mulher, em nome da propaganda governamental.
Mas, mesmo com todos estes artifícios, paulatinamente, a besta do desemprego vem-se abatendo sobre os açorianos e as açorianas. Os últimos dados, que apontam para a ultrapassagem da barreira dos 5% de taxa de desemprego, são alarmantes e mais alarmantes se tornam, quando neles reconhecemos um deslizar lento, mas progressivo, desta taxa.
A divulgação destes dados, pelo INE e a resposta dos responsáveis regionais foi de molde a pôr a nu, o que norteia hoje o Partido Socialista: manter-se no poder a todo o custo. A pressa com que vários responsáveis governamentais vieram tentar manipular números, para dar outra cor à realidade insofismável dos dados estatísticos, foi uma vergonha.
Como diria um Primeiro-Ministro da República, de um anterior governo Socialista - " As pessoas não são números! " - .
Hoje, esta frase, utilizada em campanha eleitoral, há uns anos atrás, faz todo o sentido em ser relembrada, aos responsáveis socialistas nos Açores.
Não se trata só do aumento do desemprego. A política económica, orientada pelo actual governo, tem impulsionado o aumento brutal das desigualdades. Outra coisa não é possível dizer de uma política de baixos salários e de uma precariedade sem precedentes. Se não fosse trágico, podíamos parafrasear o poeta e afirmar que o sector privado nos Açores - "É um imenso mar"... de salários baixos e precários. Na Construção Civil, nas Pescas, na Hotelaria e derivados, em sectores crescentes dos Serviços e mesmo na Administração Pública, imperam ordenados entre os 500 e os 650 euros, numa precariedade imensa.
A somar a isto, não esqueçamos que a nossa Região é campeã, na aplicação do Rendimento Social de Inserção, em valores relativos.
Este quadro é deveras preocupante, porque, mesmo o trabalho, é sinal de pobreza. É este o resultado de uma política económica assente no paradigma de desenvolvimento, através de baixos salários.
Que projecto de vida pode ter um ou uma jovem, perante um cenário destes? Não temos dúvidas de que a desestruturação familiar tem também aqui a sua fonte e a disfunções sociais têm, neste quadro, a sua principal receita para crescerem.
Ouvimos, por todas as ilhas, a mágoa pela fuga de jovens, académica e tecnicamente, preparados. Esta é uma riqueza que todos os dias se esvai da nossa Região, hipotecando-nos o futuro.
Alterar este paradigma de desenvolvimento económico é a tarefa de hoje e já vamos atrasados. A governação socialista, ao fim de doze anos, não teve a coragem de o fazer e os anúncios para o futuro não são de molde a tranquilizar-nos.
O Bloco de Esquerda/Açores, como tem vindo a fazer, opor-se-á, terminantemente, à política de privatizações apresentada, por Carlos César, para a próxima legislatura.
Privatizar a Sata, a Eda, os Portos, e iniciar o mesmo processo na Saúde, entre outros sectores, é aumentar as desigualdades entre a nossa população.
Permitam-me, a este propósito, algumas considerações:
- Como se explica, numa Região como os Açores, onde a Mobilidade (além de um direito) é um imperativo social de desenvolvimento económico e até cultural, entregar a SATA a privados?
Só encontro uma resposta: Pagar-lhes, com dinheiro público, os custos de exploração, mais as taxas de lucro que estes senhores assumirão como seus, por direito divino, pois, a partir daí, têm toda as condições de chantagem sobre o Governo Regional, tendo em conta que a tal da ‘desejável concorrência' não existe, nem se prevê que venha a existir.
O Governo e o Dr. Costa Neves, líder regional do PSD, muito se ufanaram, na divulgação das benfeitorias da privatização da SATA, chegando mesmo a dar o exemplo Madeirense, como o do caminho a seguir. Perante o descalabro da liberalização do transporte aéreo na Madeira, o que têm a dizer?
Quer o Governo Regional, quer o PSD, não conheciam o mercado, não sabiam das consequências de tal política? É claro que sabiam! Mas, o que escondem, é que ambos servem os interesses dos que ‘tudo podem' e tudo fazem para que, à conta do Estado e dos cidadãos, possam engordar as suas ambições financeiras.
Saúdo, daqui, os poucos deputados do Partido Socialista que, após o desastre que foi a liberalização do transporte aéreo na Madeira, souberam levantar a sua voz, na Assembleia Legislativa dos Açores, em defesa do actual modelo público da SATA.
A voz do Bloco de Esquerda/Açores, na futura Assembleia a eleger, em Outubro, aumentará a força daqueles e daquelas que combaterão estas e outras aberrações, cujo preço seria pago por todos nós.
E quanto à EDA, única empresa de electricidade na Região, a lógica é, exactamente, a mesma.
Atrair emprego qualificado só é possível, com um novo modelo de desenvolvimento económico, assente nos sectores com inovação e excelência tecnológica, sectores que aumentem a mais valia incorporada. É este o direccionamento que é preciso dar ao investimento público. Não é insistindo numa política de extensão do actual modelo que se constrói o futuro dos Açores.
Mas, dirão alguns dos acérrimos defensores da governação socialista: - "Acusar o Governo Regional de insensibilidade social é uma calúnia! Então, não se lembram das medidas que, ao contrário do Governo da República, tomámos, menos gravosas para os professores e para os funcionários públicos, nomeadamente, na contagem do tempo de serviço, antes congelada?!"
O Bloco de Esquerda/Açores não é autista. No processo de ataque aos trabalhadores e às trabalhadoras destes sectores, as referidas medidas foram um pequeno oásis de bom senso, dizemos nós. Só é pena que tenham mais por base as necessidades de um ano eleitoral, do que uma séria reflexão e posicionamento, contrários às políticas laborais implementadas pelo Governo Sócrates, de que o novo Código de Trabalho é, hoje, a peça primeira.
Camaradas, companheiros e companheiras,
Com a aprovação, por unanimidade, do novo Estatuto Autonómico dos Açores, pela Assembleia da República - que, a ser promulgado pelo Presidente da República, entrará, brevemente, em vigor - abre-se uma nova porta de esperança para a nossa Região. Aos açorianos, açorianas e suas instituições autonómicas, caberá ter nas suas mãos, de forma mais propositiva, o futuro da Região.
A promulgação do novo Estatuto, será um dia grande para todos e todas nós. Com este Estatuto, a nossa Assembleia Legislativa terá poderes para, em matérias alargadas, legislar de acordo com as especificidades regionais, nomeadamente, sobre as matérias que dizem respeito aos trabalhadores e trabalhadoras.
Neste Fórum, o Bloco de Esquerda/Açores assume, desde já, que nesta matéria dos direitos dos trabalhadores, será na Assembleia Legislativa dos Açores - tal como o tem sido na Assembleia da República - um combatente determinado e implacável, contra os desmandos que, em matéria de direitos de quem trabalha, o governo Sócrates desencadeou, bem como de quem lhe seguir as pisadas.
Ao Partido Socialista/Açores, lançamos um primeiro desafio: - que torne pública a sua posição sobre este novo Código Laboral - , pois assim, ficamos a saber quanto valem as medidas avulsas, sobre a contagem de tempo da Função Pública.
E lançamos um segundo desafio: - que mostre a sua qualidade de Esquerda, no que concerne aos seguintes pontos do Código de Trabalho:
- Não permitir que seja aplicada, nos Açores, a cláusula de despedimento, por justa causa, com base na inadaptabilidade do trabalhador/a;
- Que qualquer trabalhador, após um ano de trabalho, na mesma empresa, entre, obrigatoriamente, para o quadro;
- Que a qualquer trabalhador/a, após 40 anos de descontos para a Segurança Social, seja atribuída a reforma, por inteiro.
Não nos esqueçamos que estas propostas já foram apoiadas e defendidas pelo Partido Socialista...
Para além de muitos outros, o compromisso do Bloco de Esquerda/Açores, sobre estes pontos, está tomado. Agora, esperemos a resposta do PS/Açores.
Camaradas, companheiros e companheiras,
É tempo de acrescentar mais pluralidade à Região, com a eleição de representação parlamentar do Bloco de Esquerda/Açores. É tempo de colocar a Esquerda que é precisa, na Assembleia Legislativa, para que o constante vilipendiar dos direitos dos trabalhadores e trabalhadoras da Base das Lajes, a soberania do nosso País e os Direitos Humanos tão apregoados, não sejam, constantemente, postos em causa, com o silêncio cúmplice dos sucessivos governos Regionais.
É tempo de dar mais espaço à democracia, ao debate de ideias e às diferentes propostas para o futuro dos Açores; a escassez de contraditório, hoje, na televisão pública dos Açores, colocam-na, objectivamente, a par da Madeira, no que à não existência de debate político, entre as diversas forças partidárias, diz respeito.
É tempo de travar a voragem do aparelho de Estado pelo partido do Governo, que chega ao desplante de um pedido de audiência do Bloco de Esquerda/Açores à Inspecção de Trabalho - para nos inteirarmos dos problemas e constrangimentos com que se debate este órgão - obtenha, como resposta, que a audiência deve ser pedida ao Presidente do Governo Regional. Penso que sobre a real autonomia deste órgão, está tudo dito! Será que um órgão com esta responsabilidade, fiscaliza a mando do Governo?!
Para quem fala tanto em autonomia, o mínimo que podemos dizer é que é pouco praticante...
Também por tudo isto, o Bloco de Esquerda/Açores - É a Esquerda que é precisa na Assembleia!